Winner of the Pulitzer Prize

The restless memories of Viet Thanh Nguyen

João Céu e Silva reviews The Sympathizer by Viet Thanh Nguyen. Originally published by Diario de Noticias. 

Viet Thanh Nguyen, author of The Sympathizer
Viet Thahn Nguyen é o autor do premiado O Simpatizante

É pouco habitual nos romances que vão surgindo nas livrarias existir a tensão que O Simpatizante provoca no leitor.

A guerra que dá início ao romance O Simpatizante teve início no ano de 1946, com o fim da colonização francesa de uma Indochina que se dividirá em Vietname do Sul e do Norte, e que só acabará no dia 30 de abril de 1975. Uma data que marcou ocupantes e ocupados e que, sendo dada como referência, mais nada significa pois continuaram as hostilidades por muitos meses (anos!) entre quem ficou no terreno.

The Sympathizer by Viet Thanh Nguyen, Portuguese cover

Principalmente, porque o ocupante era uma potência mundial, os Estados Unidos da América, e vivia-se o tempo da Guerra Fria. Isso observa-se bem ao pegar-se no romance de Viet Thanh Nguyen, em que se sente logo o ambiente repleto de um odor a cobardia de quem não quer ser mais derrotado e foge.

O cenário, muito bem descrito do itinerário de fuga até ao aeroporto, mostra-nos uma capital que vai entrar numa zona negra da história e pessoas já marcadas e o leitor mais velho e o mais jovem culto irá ter sempre na cabeça a imagem dos últimos fugitivos de Saigão num helicóptero que aterra no topo das instalações da embaixada norte-americana da atual Cidade de Ho Chin Minh enquanto ler este romance. Será o grande símbolo do fim da história do Vietname que marcou sucessivas gerações de jovens soldados americanos e que o autor recupera por via de uma metáfora que em O Simpatizante é constante nas primeiras páginas, mas que à página 59 é flagrante no paralelismo entre o desaire que acontece ao último meio de fuga desde Saigão de 1975 e o que agora é recriado por Nguyen nesta narrativa.

Para trás, tanto na realidade como na ficção, ficava um retrato com milhões de mortos fruto de um “gasto” de quatro milhões de toneladas de bombas e 75 milhões de litros do “agente laranja”, produto que infetou grande parte da população. Para trás, neste livro, fica um relato pessoal, moral e a vivência de quem estava no terreno e se debatia com sérios problemas morais devido ao colaboracionismo.

Entre as muitas camadas desta narrativa, há uma que interessa especialmente, a radiografia de como se (de)formou a mentalidade do protagonista ao longo da necessidade de sobrevivência num país ocupado, apropriando-se de um cenário tão delirante como realista que até faz lembrar o Apocalypse Now, de Copolla.

Viet Thanh Nguyen nasceu quatro anos antes da queda de Saigão. É descrito como um romancista vietnamita-americano, um entre muitos autores que fazem parte de segundas gerações nascidas nos EUA de pais asiáticos ou africanos, entre outras partes, que recuperam a memória do que não viveram em primeira pessoa mas esteve sempre presente em casa e nas histórias que ouviram enquanto cresceram.

É professor de Estudos Ingleses e Americanos Étnicos na Universidade da Califórnia do Sul e esta é a sua primeira obra publicada, tendo sido unanimemente reconhecida e premiada: o Prémio Pulitzer para ficção, os do Dayton Literary Peace Prize e do Center for Fiction First Novel Prize e, entre outros, o Asian/Pacific American Award para literatura de ficção.

É um entre muitos escritores que protagonizam a literatura atualmente na moda nos Estados Unidos, a dos herdeiros dos imigrantes, só que vale a pena lê-lo atentamente. Afinal, os pais fugiram de Saigão após a queda e montaram uma mercearia estilo vietnamita bem-sucedida que pagou os estudos de Nguyen em Berkeley. A ele cabia pagar com Arte e O Simpatizante é esse grande testemunho literário.

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