Winner of the Pulitzer Prize

Autor de ‘O simpatizante’ diz que usa projeção do Pulitzer para falar de guerra, migração e política

Alessandro Giannini interviews Viet Thanh Nguyen for O Globo

Vietnã, 1965: Guerra serve de pano de fundo para o premiado ‘O simpatizante’ – Horst Faas/AP Photo

SÃO PAULO — Ganhador do Pulitzer de ficção no ano passado com seu romance de estreia, “O simpatizante” (que a Alfaguara lançou no Brasil no fim do mês passado), o professor e escritor Viet Thanh Nguyen publicou um novo livro — uma reunião de contos batizada “The refugees” —, negocia com Hollywood a adaptação para o cinema de seu trabalho premiado, e já escreve uma continuação para as aventuras de seu agente sem nome. Aos 46 anos, ele não nega, portanto, a importância de um prêmio. Mas afirma ter consciência de que “O simpatizante” não foi premiado apenas por suas qualidades literárias.

— Por fazer parte da Academia e ser também um crítico, conheço a natureza dos prêmios e sei bem que há muitas circunstâncias envolvidas nessas escolhas, e algumas delas são de ordem política e social — argumenta o autor vietnamita, em entrevista ao GLOBO, por telefone, da Califórnia, onde vive. — O Pulitzer, em geral, é concedido a escritores de minorias, como eu, porque nós preenchemos a função de ser a voz da oposição nos Estados Unidos.

Professor de Estudos Ingleses e Americanos e Etnicidade na Universidade do Sul da Califórnia, Nguyen atribui a premiação também à história das lutas das minorias étnicas nos EUA. Ele sabe do que está falando não apenas por sua posição na Academia, mas porque fez parte de um grupo de refugiados vietnamitas que desembarcou em terras americanas em 1975, após a Queda de Saigon, na fase final da Guerra do Vietnã. Inicialmente, ele e sua família ficaram em Fort Indiantown Gap, na Pensilvânia, um dos quatro campos de refugiados vietnamitas construídos no país.

— Acho que a minha carreira, o livro e o prêmio só foram possíveis por causa das históricas lutas das minorias por seus direitos sociais e políticos nos EUA. Devo reconhecer os esforços feitos antes de mim para que tivéssemos condições de ganhar este prêmio. Por isso, tenho aproveitado o fato de que as pessoas estão dispostas a ouvir o que tenho a dizer para falar de questões importantes e urgentes, como guerras, refugiados e política contemporânea — conta o escritor.

Ambientado justamente no período em que Nguyen chegou aos EUA, “O simpatizante” conta a história de um agente duplo que se infiltra no Exército sul-vietnamita e migra com um grupo de refugiados. Sem nome, ele finge ajudar os companheiros a promover a contra-revolução ao mesmo tempo em que manda informações para seus superiores no governo comunista do Vietnã.

— Quando o meu agente disse que eu precisava escrever um romance, a primeira coisa que me veio à mente foi espionagem, porque sou muito interessado nesse tipo de livro — lembra o autor. — E queria escrever um romance que fosse divertido e, ao mesmo tempo, curioso. Como gênero, o romance de espionagem permite ambos. Ao estudar a Guerra do Vietnã fiquei sabendo que havia espiões, e então percebi que o gênero romance de espionagem cairia como uma luva para a narrativa.

Boa parte da trama veio diretamente da história da Guerra do Vietnã ou do fim do conflito.

— Por exemplo, eu sabia que havia esforços por parte dos sul-vietnamitas de voltar ao Vietnã e retomar o país. Então, achei uma boa ideia fazer meu espião vir para os Estados Unidos com eles enquanto tentavam uma contra-revolução. Eu criei um personagem atraente, que me permitiu explorar problemas dos espiões, como lutar com suas identidades duplas — explica Nguyen.

“O simpatizante” tem várias referências literárias e do mundo pop. O início, por exemplo, pode ser creditado a “Homem invisível”, de Robert Ellison. A certa altura, o personagem do espião atua como consultor de Francis Ford Coppola em “Apocalypse now”.

— Um bom livro funciona em pelo menos dois níveis. Um, do puro entretenimento, no qual você não precisa saber nada da Guerra do Vietnã ou de literatura para gostar da história. E outro, abaixo desse, no qual o romance é uma obra de arte que eu pretendo que converse com a história da literatura. Leitores cientes dessas citações podem desfrutar delas com mais prazer — aposta ele.

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